o multiverso de Malevich (e a relevância dos Arkhitektons).
consideração.
Por João Centeno 13-12-2020 Foi já há mais de 100 anos que o pintor Kazimir Malevich (23 de Fevereiro de 1878 - 15 de Maio de 1935) concluiu o movimento suprematista no plano bidimensional, com o quadro White on White (1918). Este último exprimia, na sua completude, os ideais previstos no manifesto suprematista, a metamorfose de todas as formas no infinito do cosmos, um espaço imersivo onde o observador se perderia repleto de puro sentimento - no zero da forma. Em 1919, impulsionado pela Revolução de Outubro na Rússia, que ocorrera dois anos antes, Malevich declara que o produto final do movimento suprematista não seria a pintura, mas sim a arquitetura, o plano tridimensional, ou, pelas palavras do próprio, “o único sistema possível numa era de nova arquitetura”. O pintor, sempre muito presente na manifestação artística deste novo regime político, é convidado por Marc Chagall, assim como por alguns dos seus seguidores e alunos, para viajar até Vitebsk, actualmente Belarus, para se juntar a um novíssimo grupo de artistas intitulado UNOVIS, ou Os Campeões da Nova Arte. Foi aí, e mais tarde no Instituto de Artes de Leningrado, que se criaram as maquetes de plástico Arkhitektons. Denominação derivada da palavra grega arkhitektoneo, que etimologicamente significa ser arquiteto ou construtor, eram construções que não dispunham de qualquer função, organização interna ou escala, reimaginando os princípios da própria arquitetura e tentando inseri-los num contexto mais abrangente. Estas formas, que visualmente apresentavam diversos volumes agregados uns sobre os outros, visavam, através da sua composição, exprimir a não-objetividade presente nos anteriores retratos suprematistas. Como era de esperar, o conceito de cosmos manteve-se no raciocínio de Malevich, que falava aos seus alunos de possíveis cidades cósmicas, que habitavam a atmosfera terrestre. Atribui nomenclaturas de origem grega, da mesma maneira que os astrólogos rotulam as diferentes constelações. Alpha, Beta (num eixo horizontal) ou Gota (num eixo vertical) estão entre os elementos inaugurais. As composições suprematistas deveriam romper com o campo gravítico da Terra e servir de veículo para uma utópica exploração espacial. Assim nascem os planits (conceito já explorado através de telas suprematistas) a segunda etapa conceptual destes modelos tridimensionais - instalações que divagam pelo espaço sideral e são habitados por terráqueos, juntando-se assim às estrelas e planetas que já habitam o vasto universo. É impossível passar ao lado do compromisso visionário que definiu Kazimir Malevich. Através da criação dos Arkhitektons conseguiu aliar arte, arquitetura e tecnologia num só elemento, uma máquina suprematista. Foi o motor de combustão para o que, 40 anos depois, seria o lançamento do primeiro satétile artificial, o Sputnik (nome que foi o próprio Malevich quem propôs quando se referia a alguns dos seus quadros). Um passo em frente para a arquitetura, que a libertou das amarras supérfluas da política e da religião, e a encaminhou rumo a novo caminho cheio de possibilidades. A arte pela arte e por um mundo artístico mais livre. - Um texto de João Centeno 13-12-2020 |